Outra coisa que também se torna evidente no que escrevi. É que, de certo modo, vinte anos depois, continuo sem ter uma noção realista do que se passa à minha volta. Que tenho andado a viver como se a vida fosse uma festa, quando afinal é um velório.
Perdoa-me, Joana. É difícil combater toda esta morbidez quando durante uma semana (ou uma vida) se anda encharcado em morte e em sangue (E isto literalmente! A propósito, a ferida já se nota pouco. A cicatriz vai ficar grande, de certeza, mas fica um pouco escondida pela barba, que estou seriamente a pensar deixar crescer, e só aqui no quarto é que tenho tirado o cachecol. É estranho olhar-me no espelho. Fico mesmo diferente de barba. Bastou uma semana sem a fazer. E sinto-me diferente, também. Sabes, acho que estou a precisar de chorar, para verdadeiramente voltar a mim, mas estou tão cansado que nem isso consigo fazer…)
Enfim, perdoa-me todas estas digressões mas é difícil não me perder. Li e reli o que já escrevi e percebo que isto não será útil apenas para ti. Eu preciso voltar a sítios da minha vida que são como aquele corredor da casa da tia Júlia que achei tão comprido e escuro aos cinco anos. Agora sei perfeitamente onde estão os quartos, a despensa, a cozinha. Sei onde vai dar cada uma das portas. Mas não é o hábito que torna as coisas mais compreensíveis. O hábito cega-te. Eu preciso voltar a esse corredor e tentar perceber o que vi quando abri as portas, em diferentes momentos da minha vida. Tenho a certeza que será aí que vou achar a pista de que preciso agora para encontrar o Jaime. As páginas amarelas de Salzburgo são inúteis. Talvez até consiga perceber do que é que ele anda a fugir (ou o que é que ele anda a combater?). Porque, sabes, eu tenho uma séria suspeita do que é, mas, como o Dom Quixote alternativo, eu, neste momento, preferia não acreditar em gigantes…
segunda-feira, 16 de janeiro de 2006
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
Sem comentários:
Enviar um comentário