Sabes, eu sempre senti um ciúme secreto do Jaime. Por ser ele quem vivia com a tia Júlia. E é estranho estar a dizer, escrever isto pela primeira vez. Ainda mais nestas circunstâncias tão…oh, tão irónicas!
Não duvides, por favor, do meu amor pela minha mãe. Mas há sempre um apelo especial naquilo que não se possui. Eu invejei muito tudo o que o Jaime tinha. Os brinquedos - mais e mais caros do que os meus. A escola privada - com uniformes, bons professores e festas de Natal com teatro e prendas. As aulas de tiro com arco, judo e natação. Mas acima de tudo, o facto de, ao fim do dia, ele continuar na casa da tia Júlia, de dormir lá, de ser, de facto, aquela a sua casa. E de a tia Júlia ser mais dele do que minha.
Mas, é claro, isso eram tolices infantis, e eu sei o esforço que a tia Júlia sempre fez para nos tratar como iguais, mesmo com todas as diferenças de posse. E tão difícil que isso deve ter sido para ela, sei eu agora. Bastou-me olhar para ti, Joana.
Além disso, o Jaime sempre foi o mais generoso dos irmãos. O que tinha ele que eu não tivesse? Ele sempre se fez uma parte de mim. E vice versa.
Por isso eu tinha a certeza de que, se eu não sabia que as vizinhas chamavam bruxa à tia Júlia, menos o sabia ele. E foi por isso que resolvi descobrir o que se escondia de verdade por trás daquela história. Se algo houvesse naquilo que pudesse magoar o Jaime, devia primeiro magoar-me a mim.
terça-feira, 13 de dezembro de 2005
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