terça-feira, 8 de novembro de 2005

Muda-se o ser, muda-se a confiança

Ontem à noite, lá em casa, estivemos a ver os documentários "making of" da série "Nip/tuck". Para além de ter ficado espantado com a lucidez dos actores, realizador e escritores (não admira que a série seja boa) alguém referiu a certo ponto que os Estados Unidos são um país obcecado com a mudança pessoal e que, sendo tão difícil fazer mudanças no interior, se passou a tentar compensar isso com mudanças corporais, seja simplesmente através de exercício físico ou, mais radicalmente, com cirurgias plásticas.

Isto lembrou-me um comentário que tinha lido há pouco tempo num forum sobre livros em que alguém dizia que os livros que lhe agradavam eram os livros em que as personagens mudavam, alteravam o seu comportamento (sempre para "melhor", refira-se).

E de facto, olhando para uma grande maioria da ficção que consumo, que vem também na sua maior parte do mundo anglófilo, há sempre essa convicção marcada de que as pessoas podem mudar, admitir os seus erros e seguir redimidas pelo caminho do amor, da moral ou da justiça.

É bom acreditar nisso. Até eu gosto de acreditar nisso. Mas a minha visão cínica do mundo leva sempre a melhor. Eu não acho que as pessoas de facto mudem. Acho que há apenas uma adaptação às circunstâncias que é feita sempre com o propósito egoísta de melhorar a sua própria vida (conseguindo mais amor, mais moral e mais justiça).

Neste ponto de vista, olhando para os meus dois livros publicados, percebo perfeitamente porque é que o seu sucesso é tão diferente:

_ No romance para adultos ninguém muda. As personagens são cobardes, fogem à vida porque isso implicaria tomar iniciativa e provocar mudanças internas de personalidade e de valor moral. Escolhem sempre a alternativa fácil. E mesmo que no final não pareça ser assim, o final feliz graças à mudança é uma mera ilusão.

_O livro infantil é, no fundo, exclusivamente sobre mudança, sobre construção de identidade, alteração de comportamentos que trazem harmonia ao mundo. É (literalmente) uma visão arco-íris da humanidade. É aquilo em que queremos acreditar quando ainda somos crianças.

Tendo isto em conta, percebo perfeitamente porque é que o livro infantil, em 4 meses, vendeu quase o dobro do que livro para adultos em 2 anos...

E eu, que balanço pessoal é este entre criança e adulto, cinismo e esperança? ...Até agora, vai bastante equilibrado, julgo eu...

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