domingo, 16 de novembro de 2008

Na telenovela da humanidade, este é talvez um episódio charneira.

Devo ser dos poucos que ainda não falou do Barack Obama no seu blog. Estive-me um pouco nas tintas para seguir a eleição porque afinal de contas, eu não ia votar e acho um pouco parolo estar a tecer conjecturas sobre coisas que me escapam tanto ao entendimento, influencia e controle. No entanto, não consegui manter a ignorância intacta porque, quanto mais não fosse, trabalho com três americanos, a minha empresa trabalha com empresas que dependem da indústria petrolífera, e logo, durante os últimos meses, as conversas ao almoço acabaram sempre por descambar para o senhor Obama.

Entretanto, a semana passada, no emprego, começámos com a iniciativa de ter um clube do livro e do filme. Cada pessoa ficou encarregue de escolher um livro ou um filme que achasse relevante partilhar com os colegas. Eu tenho estado hesitante entre o "Dune" de Frank Herbert (relevante pelo seu aspecto ecologico/económico/social) e o "First and Last men" de Olaf Stapledon (relevante pelas suas especulações ecológicas/económicas/sociais). De qualquer maneira, ambos são especulações sobre o futuro da humanidade.

No mesmo almoço em que falava sobre estes livros aos meus colegas, tinhamos o jornal financeiro da noruega aberto sobre a mesa. Na página da esquerda, mais um artigo alarmista sobre como as reservas petrolíferas do planeta estão a acabar e como é preciso procurar novas fontes de energia não poluentes. Na página da direita, mais um artigo alarmista sobre como é preciso aumentar a exploração petrolífera porque os recursos energéticos não chegam para as necessidades mundiais.

No meio deste cenário, um colega diz-me que a ficção dientífica é uma coisa do século XX e que ultimamente as pessoas já não têm a mesma necessidade de inventar um futuro utópico. Eu, como me estava a levantar para ir buscar mais um waffle, acabei por não lhe responder, mas como discordo absolutamente do que ele disse, apeteceu-me vir ventar aqui para o blog.

Se há uma coisa historicamente original nos tempos que correm (isto é, o curto espaço temporal do Renascimento até hoje), é a consciencia da humanidade como um todo. Pela primeira vez percebemos que somos uma espécie única e que o nosso comportamento global de irresponsabilidade ecológica (em todas as suas vertentes de comportamento social, cultural e económico) põe em risco a nossa existência. Somos um corpo único, quase como um paciente fumador advertido pelo médico de que o cancro espreita se não se mudar o comportamento.

É claro que os cientistas e os escritores de ficção científica mais histéricos já nos informaram que a espécie humana vai, tarde ou cedo, ter de abandonar este planeta. Talvez não seja muito relevante ter reservas éticas sobre em que estado o vamos deixar porque afinal de contas, depois disso o sol explode e ficará tudo em fanicos. É o mesmo dilema que, digamos, se eu sair de casa, sabendo que pouco depois ela vai pelos ares, me dou ao trabalho de deixar a cama feita com lençois lavados.

Esta grande divagação para voltar mais concretamente ao senhor Obama e à minha opinião sobre ele, que é o que é relevante aqui para a blogosfera. O que me apetece dizer é que acho este envolvimento, júbilo internacional e renovar de esperança em volta de um único homem, tocante. É comovente, como se toda a gente quisesse ser Um e lhe dissesse: tu és nós e nós somos tu. É claro que é ingénuo. Afinal de contas o homem onde ser quer por muita esperança vai ter o cargo que mais ódio suscita no mundo. Quanto tempo se consegue idolaterar a face visível do capitalismo imperialista?

Mas é bonita, a ingenuidade. Pode ser uma ingenuidade infantil, pois pode, mas não faz mal, porque a Humanidade afinal de contas é mesmo uma criança.
Aguente-se à bronca, senhor Obama.
Da minha parte, o optimismo vem de ver alguém disposto a queimar-se. É inspirador! Obrigado senhor Obama. Desde Jesus que não tinhamos ninguém tão disposto a ser julgado em praça pública. Obrigado por nos deixar imaginar uma utopia, às custas do seu sistema nervoso pisoteado por nós (no mínimo).

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